quinta-feira, 30 de outubro de 2014

GRAVEI O MEU NOME NA CASCA DA ÁRVORE



Gravar o próprio nome com imagens de coração, flechas, flores, ninfas
e Cupido em tronco de árvore já foi tão comum quanto é hoje tatuar
no corpo o nome do amado ou da amada sobre fundo paisagístico
semelhante aos mais antigos motivos e arabescos. Quem viveu no interior
entre os animais e as plantas e saboreou a magia do canivete rasgando os
veios da madeira fazendo surgir um nome, dois corações enamorados,
sabe o que significa marcar o tempo com o amor e acreditar que este
cresce no mesmo sentido da arvore, para cima. Um grande engano, pois,
se a casca não se regenera e encobre a inscrição, a gravação permanece
indefinidamente no mesmo lugar.
Os primeiros registros da prática de escrever em árvores surgiram com
os colonizadores portugueses e espanhóis, cujas expedições deixavam o
seu marco por onde passavam com os nomes dos viajantes eternizados em
troncos robustos como baobás. É fato que não faziam por romantismo nem
por vaidade pessoal, mas tão somente para assegurar à Coroa o domínio da
terra conquistada, o que não é totalmente diferente dos amantes que gravam
seus nomes, em árvores ou corpos, na intenção de fixar na matéria sólida o
que a subjetividade encobre no invisível afeto, mas que os amantes fazem
questão de exibir aos olhos do outro da forma mais artística e de acordo
com a sociedade na qual vivem.
Igualmente à tatuagem que marca o outro na carne do outro, a gravação
na casca da árvore tem o poder de expor o tanto de pertencimento que existe
na relação a dois, ou mesmo na relação do homem com a natureza que o
cativa. Há relatos de pessoas que voltam ao local onde deixaram sinais de
sua passagem apaixonada, reencontrando a inscrição no mesmo lugar e em
perfeito estado não fosse a secura do corte ter sulcado a árvore velha. Corte
tão sem vida quanto o amor gravado no tronco.

Ana Barros
 Natal, 29 de outubro de 2014.





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