domingo, 6 de julho de 2014

Foto: Ana Barros
CANTO DE MURO

O sonho que muitos têm de adquirir um apartamento e "viver em segurança" até o fim da vida num condomínio fechado não é o de quem adora ter uma casinha com direito a quintal onde mantém a horta, flores, pombal e a casinha do cachorro. Não há ambiente mais democrático do que o quintal de uma casa com seus cantos de muro ocupados por uma variedade de coisas necessárias e essenciais não só aos donos como também aos vizinhos que, aqui e acolá, batem à porta pedindo algo emprestado. Observando bem vamos encontrar, além dos cacos com as flores da estação, baldes escorados nas paredes, vassouras velhas jogadas, pá de lixo furada, cadeiras mancas, sandálias quebradas, varais com roupas estendidas, baldes cheios da água da última chuva, gaiola de passarinho, facão espetado nalgum tronco seco de árvore, tamboretes, restos do fogo à lenha ou carvão vegetal, água servida escorrendo na vala estreita, caldeirões e caçarolas sujas do jantar de ontem, touceiras de cebolas, botijão de gás, escada, telhas, rodas, pneu velho, bicicleta enferrujada, canos, pedras, tijolos, formigas em abundância e o penico de vovó mijar à noite. Ah, ainda tem o "puxadinho" feito às pressas pelos filhos para acomodar o vovô, pois há anos saiu de casa para morar com outra e agora volta doente, sem dinheiro e sem a acolhida generosa da antiga família, que obriga a mãe, já velha, doente e cheia de ódio do ex-marido, recebê-lo no quintal, espaço sagrado da sua casa.

Ana Barros
Natal, 05 de julho de 2014.

 

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